Prefeita de Campo Grande Demite Secretária de Saúde em Meio a Crise e Acusações de Desvio de R$ 156 Milhões

Em um cenário de crescente insatisfação popular e graves acusações de má gestão, a prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), procedeu com a exoneração da secretária municipal de Saúde, Rosana Leite de Melo. A decisão foi formalizada em uma edição extra do Diário Oficial, publicada na sexta-feira, 5 de setembro de 2025. A partir do sábado seguinte, 6 de setembro, a pasta será administrada por um comitê gestor, que terá como coordenadora Ivone Kanaan Nabhan Pelegrinelli, ex-secretária municipal de Iguatemi.

Crise Crônica na Saúde Pública e Denúncias de Desvios

A mudança na liderança da Secretaria Municipal de Saúde (Sesau) ocorre em um momento crítico, marcado por uma persistente crise que afeta diretamente a população da capital sul-mato-grossense. Os cidadãos têm enfrentado dificuldades significativas, incluindo a escassez de leitos de internação e de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) nos hospitais, a falta de profissionais médicos e de medicamentos essenciais nas unidades de saúde, além de problemas com equipamentos como aparelhos de raio-X, entre outras deficiências estruturais e operacionais.

As denúncias sobre a falta de medicamentos não são recentes. Elas já haviam sido levantadas durante o período eleitoral do ano anterior. Naquela ocasião, a prefeita Adriane Lopes atribuiu a responsabilidade pela escassez a um servidor, alegando que este teria agido para sabotar sua administração e favorecer sua adversária política, Rose Modesto (União Brasil). No entanto, mesmo após sua reeleição e quase um ano decorrido, a questão da falta de insumos farmacêuticos nas unidades de saúde permanece sem solução efetiva.

A relação entre a prefeita e a então secretária de Saúde, Rosana Leite, era publicamente conturbada, com desentendimentos que chegaram a repercutir amplamente nas redes sociais. A demissão de Rosana Leite, que possui um histórico como secretária nacional de combate à COVID-19 na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), já era especulada desde o ano passado, dada a intensidade das tensões e dos problemas enfrentados pela pasta.

Após sua exoneração da Sesau, Rosana Leite de Melo, que é médica concursada do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul Rosa Pedrossian e professora universitária, foi realocada para um cargo de assessora na Casa Civil. Esta pasta é atualmente dirigida por Thelma Fernandes Mendes Nogueira Lopes, que é concunhada da prefeita Adriane Lopes.

Comitê Gestor Assume a Sesau

A gestão da saúde municipal será agora confiada a um comitê gestor. A liderança deste grupo ficará a cargo de Ivone Kanaan Nabhan Pelegrinelli. Antes de assumir esta nova e desafiadora função, Ivone atuou como secretária municipal de Saúde em Iguatemi, um município com aproximadamente 14 mil habitantes. Mais recentemente, na própria Capital, ela ocupava o cargo de gerente de Proteção Social de Alta Complexidade na Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania.

É importante ressaltar que Ivone Pelegrinelli não assumirá o posto de secretária de Saúde, mas sim a coordenação do comitê gestor. Este colegiado será composto por uma equipe multidisciplinar de servidores e gestores, com responsabilidades específicas:

  • Ivone Kanaan Nabhan Pelegrinelli: Coordenadora Geral do Comitê.
  • Andréa Alves Ferreira Rocha: Secretária Municipal de Administração e Coordenadora Jurídica.
  • André de Moura Brandão: Secretário Especial de Licitações e Contratos.
  • Catiana Sabadin Zamarenho: Secretária Especial de Planejamento e Parcerias Estratégicas e Coordenadora de Planejamento e Gestão Estratégica.
  • Isaac José de Araújo: Secretário-Adjunto de Finanças e Coordenador Financeiro.
  • Vanderlei Bispo de Oliveira: Ex-prefeito de Japorã e Coordenador Administrativo.

Nove meses após o início de seu segundo mandato, a prefeita Adriane Lopes justificou a criação do comitê como uma medida essencial para o planejamento, a reestruturação e a execução das ações na Sesau. Conforme o decreto de sua criação, o grupo terá a incumbência de assegurar a continuidade da administração dos serviços de saúde durante um período de reestruturação e descentralização da pasta, com um prazo estabelecido de seis meses para a conclusão de suas atividades iniciais.

Conexões e Perfis dos Membros

Alguns dos membros do comitê gestor possuem laços ou históricos que se entrelaçam com a trajetória política da atual administração. Ivone Pelegrinelli, por exemplo, é natural de Iguatemi, mesma cidade de origem da prefeita Adriane Lopes e de seu esposo, o deputado estadual Lídio Lopes (PP). André Brandão, outro integrante do comitê, já atuou como vereador no município de Japorã. Isaac José de Araújo, contador de formação, é membro da Assembleia de Deus Missões, congregação onde a prefeita exerce a função de missionária.

Denúncias de Desvio de Recursos e Impacto na População

A substituição na Secretaria de Saúde ocorre em um momento de intensas denúncias sobre o desvio de recursos públicos. O Conselho Municipal de Saúde, órgão de controle social, apontou um suposto desvio de R$ 156 milhões destinados à área da saúde. Enquanto tais valores seriam supostamente realocados para outras finalidades, a população de Campo Grande continua a enfrentar a precariedade na prestação dos serviços de saúde.

Na terça-feira, 2 de setembro de 2025, o vereador Landmark Rios (PT) trouxe as denúncias de desvio milionário à tribuna da Câmara Municipal. Ele também destacou que uma fiscalização recente confirmou a ausência de 37 medicamentos considerados essenciais nas Unidades Básicas de Saúde dos bairros Tiradentes e Carlota. Além disso, o vereador alertou para a falta de remédios controlados no Centro de Atendimento Psicossocial (CAPs), evidenciando a amplitude da crise.

No primeiro semestre do ano, a situação da saúde já havia gerado preocupação grave entre os profissionais. Médicos da Santa Casa registraram boletins de ocorrência na Polícia Civil, alertando para o risco iminente de pacientes internados sofrerem sequelas ou até mesmo virem a óbito devido à falta de medicamentos na instituição hospitalar. O Ministério Público Estadual (MPE) tem atuado ativamente, ingressando com diversas ações judiciais na tentativa de zerar as extensas filas de espera por exames, consultas, cirurgias e, inclusive, a carência de leitos em UTIs na capital.

A Complexidade da Gestão da Saúde Municipal

A gestão da saúde pública em grandes centros urbanos como Campo Grande frequentemente enfrenta desafios multifacetados, que vão desde a alocação eficiente de recursos até a garantia de acesso universal a serviços de qualidade. Casos de desvio de verbas e a escassez de medicamentos e leitos são, infelizmente, problemas recorrentes em diversas cidades brasileiras, impactando diretamente a vida dos cidadãos mais vulneráveis. A atuação de órgãos de controle, como o Ministério Público Estadual e os Conselhos Municipais de Saúde, é crucial para fiscalizar a aplicação dos recursos e assegurar a transparência na administração pública, buscando mitigar os efeitos dessas crises na população.

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