Justiça Condena Três e Absolve Quatro em Caso de ‘Funcionárias Fantasmas’ no TCE/MS Após 23 Anos
Após mais de duas décadas de tramitação judicial, a Justiça de Mato Grosso do Sul proferiu uma sentença parcial no caso das “funcionárias fantasmas” do Tribunal de Contas do Estado (TCE/MS). Das sete mulheres acusadas de receber salários sem prestar serviços entre março de 2001 e julho de 2002, apenas três foram condenadas por improbidade administrativa. A decisão, publicada nesta quinta-feira (25), chega 23 anos depois da eclosão do escândalo.
O Escândalo no TCE e a Investigação
O caso remonta ao início dos anos 2000, quando denúncias de irregularidades abalaram a credibilidade do Tribunal de Contas, uma instituição cuja missão é justamente fiscalizar o uso do dinheiro público. Um “pente-fino” foi realizado em 103 funcionários, e sete deles foram identificados como supostos “fantasmas”, recebendo remuneração sem efetivamente trabalhar.
As Condenações e os Valores a Serem Devolvidos
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, fundamentou a condenação de três das acusadas na existência de processos administrativos disciplinares prévios que resultaram em suas demissões. Segundo o magistrado, as provas colhidas demonstraram que Neli Aparecida Todsquini, Marlene Cerzózimo e Regina Marina Aparecida Câmara foram submetidas a procedimentos internos instaurados pela Presidência do TCE/MS.
O processo administrativo concluiu que elas não compareceram ao serviço por mais de 60 dias de forma injustificada no período de março de 2001 a julho de 2002, mas continuaram a receber integralmente suas remunerações. Neli Aparecida Todsquini, que atuava como auditora de controle externo, recebeu R$ 30.430 sem trabalhar. Regina Marina Aparecida Câmara, assistente de apoio técnico, obteve R$ 26.979,32 sem cumprir expediente. Já Marlene Cerzózimo, agente de serviços gerais, recebeu irregularmente R$ 6.563,33.
O juiz Corrêa destacou em sua decisão:
“Em relação às requeridas Neli Aparecida Todsquini, Marlene Cerzózimo e Regina Marina Aparecida Câmara, a prova colhida demonstra que foram submetidas a processo administrativo disciplinar devidamente instaurado pelo gabinete da Presidência do TCE/MS que culminou na demissão das referidas requeridas em razão de não comparecerem ao serviço por mais de 60 dias injustificadamente, no período compreendido entre os meses de março de 2001 a julho de 2002, tendo recebido integralmente as respectivas remunerações (fls. 943-76), o que é incontroverso nos autos, sendo que a primeira requerida nominada afirma que se ausentou em razão de licença para tratar de assuntos particulares e as demais por licença por motivos de saúde.”
As três mulheres foram sentenciadas a restituir os valores recebidos indevidamente, com correção monetária calculada pelo IPCA em parte do período, e pela taxa da poupança e Selic em outro. Elas têm o direito de recorrer da sentença.
As Absolvições e a Falta de Provas
As outras quatro mulheres envolvidas no processo — Lídia de Paula Valenzuela dos Santos, Natalia Maria Idalo Zogbi, Noely Rabello de Barros Trindade e Tania Maria Froes Cerzózimo — foram absolvidas. O magistrado julgou a denúncia improcedente em relação a elas, argumentando a ausência de provas suficientes que comprovassem a intenção (dolo) de causar dano ao erário ou que suas ausências fossem injustificadas.
O juiz Corrêa explicou a decisão de absolvição:
“Quanto às requeridas Lídia de Paula Valenzuela dos Santos, Natalia Maria Idalo Zogbi, Noely Rabello de Barros Trindade e Tania Maria Froes Cerzózimo, não há prova suficiente de que tenham se ausentado no período ou que eventual ausência tenha se dado de maneira injustificada, o que obsta a condenação por não estarem presentes os requisitos para a configuração de ato de improbidade administrativa que causa dano ao erário.”
Possibilidade de Recursos
A decisão não é final. Além das mulheres condenadas, o Ministério Público Estadual (MPE) também poderá recorrer da sentença, buscando a condenação das quatro mulheres que foram absolvidas em primeira instância.
A Função do Tribunal de Contas e a Morosidade Judicial
O Tribunal de Contas do Estado (TCE) é uma instituição fundamental na estrutura de fiscalização do Estado Democrático de Direito. Sua principal atribuição é auxiliar o Poder Legislativo no controle externo da administração pública, verificando a legalidade, legitimidade e economicidade dos atos de gestão orçamentária, financeira e patrimonial. Em outras palavras, o TCE garante que o dinheiro público seja bem aplicado e que não haja desvios ou desperdícios.
Casos de improbidade administrativa, como o das ‘funcionárias fantasmas’, evidenciam a importância desse controle. No entanto, a longa tramitação judicial, que neste caso se estendeu por 23 anos, é um desafio recorrente no sistema de justiça brasileiro. A morosidade pode dificultar a responsabilização e a recuperação de valores desviados, além de gerar uma percepção de impunidade. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992) visa justamente combater atos que atentem contra a probidade na administração pública, exigindo dos agentes públicos a conduta ética e o zelo com o patrimônio coletivo.

